EU SINTO-ME BONITA AQUI



A propósito de um desafio numa rede social que consistia em publicar fotografias onde sentíssemos que estávamos bonitas, publiquei esta.

Tirada no inicio de Janeiro de 2016, esta fotografia mostra como fiquei uma semana após ter decidido cortar o meu cabelo que exibia já uns bons 35 cm de comprimento. Gostei logo dela porque me fez lembrar certas modas dos finais dos anos 60 do século passado como os óculos grandes, salientados mais ainda pelo cabelo curto. 

Gostei de imediato desta fotografia. Mas não de mim nela. O que é um paradoxo já que sou eu a figura central da mesma...

Não gostei de mim na fotografia porque, basicamente não estava a gostar muito de mim na altura em que ela foi tirada. Falta de confiança, extremo cansaço, muitas saudades da terra natal, sensação de falta de chão firme...

Mas agora que esses tempos negros vão desaparecendo a passos largos, cada vez que olho para a fotografia sinto-me aguerrida, corajosa, confiante, audaz, capaz de enfrentar tudo e todos... e bonita.

A fotografia obviamente não mudou desde Janeiro até agora. O meu olhar sobre ela sim, mudou - um olhar mais suave, cúmplice, de perdão, de envolvencia, de aceitação e de admiração - por quem sou, como sou e para quem caminho ser.

NUMA SEMANA PODE ACONTECER TUDO!

Estive dentro de um avião 8 horas, aterrei em Portugal, chorei de alegria quando vi os meus sogros à minha espera, tomei no colo pela primeira vez uma bebé muito especial, dei muitos abraços apertados para mandar embora as saudades, contive algumas lágrimas por timidez, larguei outras tantas para deixar entrar a alegria de rever corações, perdi o controlo emocional perante a visão de um filho adormecido numa sala de operações, toquei em algumas campainhas, geri a tristeza de não ter conseguido tocado noutras, dei a conhecer de perto a minha voz à sobrinha que aí vem, surpreendi-me por verterem lágrimas por mim, conversei muito, conectei-me novamente com quem já não estava à algum tempo, mantive Luanda sempre perto de mim, senti que o meu ninho começa a estar aí, voltei a estar dentro de um avião 8 horas. Voltei a casa. 

Tudo isto em 7 dias. 

Foi uma semana em grande...

O DESFALECIMENTO

O desfalecimento é uma queda. Perdemo-nos, alheados da realidade, num sono confuso e atribulado. O olhar fica turvo, a única pessoa à nossa frente passa a ter 4 cabeças e múltiplos braços. Queremos fugir da cama mas o corpo não segue as ordens do cérebro. O olhar começa a ficar vazio. Demora-se a formular uma frase dita normalmente num segundo. Pedimos ajuda. Pedimos ajuda com o chamamento pela mãe, com o agitar do corpo, com a solidão que toma conta da mente enquanto perdemos os sentidos...

Isto é o que imagino que o meu filho tenha sentido e pensado nos 5 minutos que a anestesia geral precisou para cumprir a sua função. Isto tudo foi o que senti ao ver o meu menino adormecer na sala de operações enquanto me convidavam a sair da sala.

O desfalecimento é uma queda: uma queda para a terra que não tem sonhos, que não tem cores, que não tem sons, que não tem vida pulsante.

E por milésimos de segundo - milésimos! - senti a culpa que não faz sentido pesar neste coração de mãe. Porque nessa queda eu fui mera espectadora da ida para o abismo e sem permissão de estender a mão para o salvar.

A PULSÃO DA ESCRITA

Créditos: www.reinaldosantos.com.br

Para mim escrever é um ato tão intuitivo como imprescindível para a minha sanidade mental.

Serve muitas vezes de válvula de escape, outras tantas de organizador de ideias e emoções. Mas é sempre, sempre! um exercício de completa vulnerabilidade e dor.

Vulnerabilidade porque me exponho ao mundo. E a mim.

Dor porque quase sempre as palavras não saem, embora me pressionem para que eu as faça sair. Mas a muito custo. Saem sempre a muito custo. 

No entanto, no dia seguinte volto a fazê-lo. E no dia a seguir, e no outro, e no outro...

Escrever é essencialmente um ato cerebral. Implica conectar-me com o que estou a sentir, implica conectar-me com o que outros estão a sentir, implica comprometer-me com o que quero transmitir e com o nível de ajuda que quero proporcionar.

E como preciso de pensar, e como isso muitas vezes me cansa, há dias em que não escrevo nada. Durante dias seguidos. 

Nesses dias em que rejeito a minha pulsão cerebral de escrever dedico-me com afinco aos meus crafts, às minhas manualidades com papel. Para usar as mãos e desligar o cérebro. Preciso muitas vezes de desligar o cérebro. Preciso muitas vezes de não pensar.

Nestes ultimos dias tenho-me deliciado com manualidades. Tenho estupidificado com cortes e tesouras e colas e afins. O cérebro estava em stand-by. Que bom este descanso.

Mas as palavras continuam aqui, a pressionarem a saída. Têm de sair. 

Posso estar longe, mas nunca fico por muito tempo.